A caminho dos sessenta posso afirmar que aprendi em anos de
psicanálise que dizer ‘não’ é saudável e libertador. Aceitei de bom grado as
vitórias, as conquistas, o conhecimento, o aprendizado, amores, amizades,
filho, viagens, trabalho, profissões. No entanto também tive que me submeter às
adversidades. Perdas pelas quais choro há anos; desemprego com filho pequeno e
sozinha pra dar conta; relações tóxicas (inclusive dentro da família); um TDAH
que me causou trocentos problemas por todos esses anos, só agora corretamente
diagnosticado; um câncer de mama aos quarenta anos, que desconstruiu meu corpo,
minha casa nesta vida, e me obrigou a reconstruir a alma com os cacos que
sobraram, pra continuar meu percurso por aqui.
Todo esse combo me suavizou por um lado e me endureceu por
outro. Portanto me sinto à vontade para dizer não a outras tantas situações,
condições e pessoas. E digo ‘não’, firmemente, às pessoas sem caráter. Nesta
fala, defino como ausência – ou desvio – de caráter a criatura que atraiçoa,
abusa, intoxica, maldiz, dissimula, tem maldade no coração, mas aparenta doçura
para conseguir o que quer a qualquer custo. Gente sem caráter não mede esforços
para enaltecer o próprio umbigo, em detrimento do outro, da participação do
outro, da colaboração do outro; gente que passa o trator por cima de quem quer
que seja, ainda que machuque, adoeça ou mate.
A mim não importa quem seja ou de onde venha: mulher, homem,
velho (“Canalhas também envelhecem”, né? Vide meu livro “Justa Causa”),
LGBTQUIA+, pessoa com deficiência (Sim! Caráter não está no corpo), profissão,
classe social... Não importa a cor da pele, etnia, raça, religião, time que
torce. Não tolero e não tolerarei a canalhice da fala doce pela frente e a flexa
atirada na minha nuca quando me viro. Não tolero e não tolerarei as cobranças
por visibilidade dos próprios feitos, enquanto é vil, venal, desumano, infame,
imoral, desonesto, hipócrita, sonso, mal, cruel. Eu digo ‘não’.
Viro as costas solenemente; me levanto, se sentar na minha
mesa; viro a cara, se me olha; mudo de calçada, se vir em minha direção;
desprezo.
Não sou espiritualmente evoluída para relevar, compreender,
perdoar e ser generosa com gente mau-caráter. Não quero e não preciso ser benevolente
com pessoas abjetas. Parabéns a quem consegue.
Por fim, não aceito cobranças, muito menos exigências dessas
criaturas repugnantes e nem atendo aos apelos de quem as defende, seja por
ingenuidade ou excesso de generosidade ou, sei lá, por má fé, por serem semelhantes.
Até porque não cobro bom comportamento de ninguém e jamais vou permitir que me
cobrem. Tenho muitas limitações, mas se tem algo que não tolero, de jeito
nenhum, é gente mau-caráter. Era só isso.
(Texto publicado originalmente em 2023)
Nenhum comentário:
Postar um comentário