Brincadeiras à parte, tive de esperar muitos dias para
começar a ler “Combustão”, de Jeanne Araújo e Cefas Carvalho, lançado em
dezembro pela Literalux. O livro realmente me foi entregue encharcado, por ter
tomado chuva na caixa dos Correios. Após dias secando e outros tantos embaixo
de uma pilha de livros pesados, para realinhar páginas e capa, enfim, ao abrir
a primeira carta, fechei o livro rápido e gritei:
“Gente?!”
De cara imaginei que o romance entre Hilda e Gregório se
passava no século XIX. As urgências do casal sempre em vielas, becos e cabarés
me conduziram a esse lugar do passado e, mesmo depois de me deparar com
detalhes que remetem ao tempo atual, continuei a viajar no tempo. Interessante
esse sentimento, que também pode ter sido instigado pelo vocabulário escolhido
pelos autores ou pela verve do jornalista Gregório.
Uma particularidade: como Jeanne Araújo é amiga pessoal, tive
a impressão de ouvir sua voz doce, baixa, com o delicioso sotaque
soteropolitano, narrando aqueles encontros tórridos num papo informal.
A vontade foi de sorver tudo de uma vez, mas preferi ler bem devagarzinho, degustando a cada duas cartas. Mantive assim o ritmo, até perceber mais dor e angústia que o prazer das recordações proposto por Greg na primeira carta. E num fôlego fechei o livro no colo.
Quanto amor, quantas histórias de tantos amores! Quanta ânsia,
quanto desejo satisfeito e não satisfeito. Quanta saudade do que não chegaram a
desfrutar. As correspondências de Gregório e Hilda me trouxeram à mente casos
reais de pessoas castigadas por “amar aquilo que não se pode ter”, que faz
sofrer e deixa marcas que doem pra sempre.
Jeanne e Cefas escrevem sobre amor e desamor, fantasia e
desilusão, luxúria impelida por afeto, pela fome do corpo, pela mentira, pela
inconstância, pelo acaso. Porém, “O que importa agora? O que isso traria de bom
ou ruim a uma história dividida em tantas pequenas partes, que juntando, não dá
uma? (...) Nós fomos e nunca fomos nada”, diz Hilda, nesse momento em que enfrentam,
cada um no seu canto, os reveses do tempo. O que ambos necessitam na velhice é
apenas reviver na lembrança o melhor do amor, o melhor do sexo de uma vida
inteira.
E me acompanhou até o fim a voz da Jeanne narrando as memórias
de Hilda, como se estivesse sentada à beira da minha cama.
(Texto publicado originalmente em 2018)
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